Tuesday, July 03, 2007




A nave dos loucos

Eis de volta ao activo os Prazos do Serrazim - cujo (aparente: porque a sua acção sempre continua, mesmo para além estas webianas paragens)adormecimento se deve mais ao mau feitio que compy tem demonstrado do que aos (em tal caso, maus) ofícios de LCO.

Pobres Prazos on line, que tão bem reflectem a condição dos seus homónimos: sem condições "físicas" estáveis, a esterilidade é o fim! (por isso, esperemos, de uma banda, que o nosso auxiliar informático aproveite a oportunidade para, redimindo-se, voltar à normalidade, e, por outra, que este tempo terrível - sem dúvida encomenda alada de JPM, que deseja instalar no continente o clima quase tropical das colónias açorianas - ao menos impeça nova vaga de incêndios pelo País fora! Tanto que Ni Cabral está já fora desses meios, dedicando-se somente, nos dias que correm, a ambientes mais aquáticos).

Mas o tema do momento está bem além destas considerações iniciais - e não, não se prende com o chumbo de SS, na FDUL, que toda a gente apregoa em todo o lado (pelo menos em todo o lado em que há juristas - o que é o mesmo que dizer que toda a superfície nacional pulsa com tal problemática!

Para já, falaremos do MOBILIS.

Sabem VExªs o que é tal coisa? Na pacatérrima cidade de Leiria, a autarquia atenta presta um serviço a todos os títulos estimável. Aliás, adaptou a referida ideia da metrópole regional, Coimbra, a qual abdicou, contudo, de tal iniciativa(após anos de consumado sucesso), alegadamente por falta de verbas... É, então, extraordinario: o que Leiria, pequena e provinciana, vitoriosamente alcança (com benefícios para todos, e aplausos para os dinamizadores), Coimbra, cabeça das Beiras, abandona!

Trata-se de um serviço de transportes, que cobre não só toda a cidade, mas também algumas das localidades que lhe são mais próximas (pense-se, por exemplo, em S. Romão), fornecendo - a troco de bilhetes não excessivamente caros - confortos que as habituais carreiras urbanas não podem proporcionar. Assentos confortáveis, música de fundo, condutores sempre amáveis, ambiente climatizado, horários satisfatoriamente cumpridos são algumas das benesses que estão ao alcance de cada um! E o Mobilis é um parnaso ambulante (sobretudo em comparação com certos infernos sobre rodas que ainda por aí vão circulando)usado principalmente pelos segmentos sociais que não têm, grosso modo, acesso a veículos próprios: ou seja, velhinhas/os em constante rumo para o hospital de Sto André e centro de saúde, e estudantes!

Pelo que se acabou de explanar, percebe-se bem que uma viagem de Mobilis é, regra geral, não só suportável, como mesmo bem agradável.

Pois bem, caros amigos, toda a regra conhece excepção: a minha, hoje, foi bizarra!


Esperando o Mobilis - eu fui a correr, a ver se ainda o apanhava, pois estava a acabar de tomar a minha costumeira bica no café de sempre (lembrei-me agora que não sei o nome do dito estabelecimento, mas apenas o do seu nome, que é o Bruno...)- estava o habitual contigente de gente setentona. Claro está - quem não conhece MIguelanxo Prado e as suas obras de mordaz mas contundente verdade nestes domínios - que, uma vez aberta a porta, todas as velhinhas quiseram sofregamente entrar em primeiro luga, não olhando a meios nem a canelas alheias. Nada de novo... No entanto, um bizarríssimo brasileiro (não, não é nada contra os brasileiros - por amor de Deus, eu passo os meus dias a apregoar, convictamente, os benefícios e a indispensabilidade da lusofonia!) resolveu começar a implicar. Alegadamente, uma octogenária tinha passado à sua frente (grande drama, não acham?;)).

Bom, o dito indivíduo começou a falar em tom estranhamente alto, a dizer que a culpa, verdadeiramente, não era daquela senhora - a qual, ao aperceber-se que tinha provocado a verborreia de um louco, se apressou a desfazer em desculpas mal cosidas - nem do mundo, mas dele, e só dele. Isto porque (argumentava) desde sempre que se lembrava de, em todo o lado (e, aparentemente, durante toda a sua vida, a qual devia já comportar umas boas 4 décadas) todos o ultrapassavam, como se ele não existisse. E que esse era precisamente o seu karma, a sua mais valia e, simultaneamente, a sua maldição: ser invisível (e gritava: INVISÍVEL!!). Só lamentava, aduzia, não saber retirar lucro de tal maravilhosa capacidade.

Eu confesso que me lembrei logo de um velho livro, que foi da minha Mãe quando era pequena, e que passou para as minhas mãos há já boas duas décadas: o "homem invisível", e as suas extraordinárias capacidades. Só que o brasileiro estava bem longe desse personagem, desde logo porque o seu carisma não era arrebatador...!;)

As velhotas acharam toda aquela história fascinante, e logo aproveitaram para tecer um sem-fim de considerações sobre a dita, enquanto o homem gritava as mesmas tretas durante os cerca de 15 minutos que viajou no Mobilis. Quando saiu, os restantes suspiraram de alívio.

No entanto, foi sol de pouca dura!

Mal o louco - que, refira-se, estava sentado atrás de mim - saiu, as duas mulheres que estavam exactamente à minha frente começaram a sua parte do show! Era mãe e filha, e o semblante grotesco e horroroso da progenitora tinha sido herdado pela filha, que, contudo, ainda conseguia parecer pior do que a sua companheira de viagem devido aos muitos quilos em excesso que tinha! A Mãe, gorda, tufada, usava um casaco branco que parecia de um primo pobre de arminho sintético, e a filha parecia ter pegado numa toalha de mesa de camilha (da qual colorira previamente umas flores com canetasde ponta de feltro) e enfiado a dita pela cabeça. Um par maravilhoso. Ah! E a filha tinha os braços mais peludos do que os meus - o que não deixa de ser ESTRANHO numa representante do sexo oposto!

Pois bem, a Mãe, embalada pela conversa do louco, começou a dizer (bem alto!) que também jamais tinha aproveitado os seus talentos naturais - que (não riam!) não eram ser invisível, mas também eram úteis... Tudo isto porque era gorda, mas a Drª Isabel (quem será?) ia resolver a questão, pois, na consulta, percebera que ela era o tipo de mulher que não quer ser gorda (mas há alguém que queira??). Por isso - sim, para emagrecer! - tinha tomado prozac(!!). A filha, que cantarolava em inglês (para delícia da mae, que não compreendia como é que o rebento tinha memória suficiente para decorar "todas aquelas músicas") concordava, e achava que também devia optar por uma dieta ("sem dúvida", tive vontade de acrescentar). Além disso - argumentava, gesticulando o braço sapudo e peludo, e uma mãozona gorda onde se enterrava um (claro!) anel de curso - o peso excessivo dificultava-lhe a vida, porque não conseguia "arranjar homem". E era preciso (a mãe concordava), mesmo que "eles fossem todos iguais", e passassem a vida de casado a trair as mulheres! Bom, acho que a flácida menina também precisava do seu prozac.

Por fim desceram (uf!), rumo, decerto, ao consultório da pobre Drª Isabel. Uma para emagrecer e, assim, por em acção as suas extraordinárias capacidades ocultas (talvez a invisibilidade, também!); outra para, quiçá, obter uma receita de prozac, perder, assim, os (muitos) quilos em demasia, e, feliz e magra, achar o homem com quem passará uma vida miserável, sendo enganada a torto e a direito!

Ah, Portugal! Quanto há ainda que avançar!