Sunday, July 22, 2012

"SPRINT" DOMINICAL FORÇADO EM LEIRIA


Quase que me sinto forçado a começar este post com um institucional “os factos aqui relatados correspondem à verdade, não tendo, de forma alguma, resultado da mente do autor”. Bom, ficam desde já advertidos: o que eu descrevo como tendo visto, foi efetivamente visto!
Todos os que, por vezes, têm de passar o fim-de-semana (e falo de fins-de-semana normais, ou seja, sem programa com amigos ou idas à praia planificadas de antemão, ou, mesmo, sem um qualquer almoço ou jantar familiar) longe de casa – e mesmo que estejam numa terra que já lhes diga alguma coisa (eu, por exemplo, tive uma amiga que, mesmo estando há mais de dez anos em Coimbra, e estremecendo a cidade, onde fizera, entretanto, inúmeros conhecimentos, odiava com todo o coração os fins de tarde e noites do Domingo, mitigando o mal estar que lhe causavam indo, invariavelmente, muitas vezes comigo, cinemar na sessão das 21.30) – sabem que estes são os dias mais longos da semana, no sentido de que são aqueles que demoram mais tempo a passar. Sobretudo os Domingos. Esteja-se numa cidade pequena ou grande (se bem que uma terra de menores dimensões possa ser mais problemática, por estar tendencialmente tudo fechado), tenha-se muito para trabalhar (mas também não se pode passar o Domingo inteiro a estudar, certo?), e mesmo que se combine uma cafézada com amigos, haverá, caso estejamos desprevenidos, sempre uma meia hora de (digamos assim) “angústia”. Ora, qual a estratégia para afugentar tal espectro? A resposta é óbvia: depende da pessoa! No entanto, aprendi há bastante tempo com a minha Mãe que o segredo-base (e isto funciona para todos, sejam quais forem os nossos gostos) é ter coisas planificadas para fazer. Ou seja, nada de projetar passar o dia a dedicarmo-nos ao ócio: em tais situações, a inevitável angústia fará, mais cedo ou mais tarde, a sua entrada em cena. Subtil a chegar, difícil de partir, como qualquer bom exemplar da sua espécie. Eu tento seguir sempre esse conselho avisado, e, em regra, não me tenho dado mal. Mas adoto para cada cidade/terra onde esteja uma estratégia diferente: a minha rotina (por exemplo, e para dar um certo estilo!) de Domingo não é diferente na “Lisboa do ocidente” e na “Lisboa do oriente”. Tal como não o é – e agora desço a voos mais prosaicos – entre-Lis-e-Lena, terra onde ocasionalmente passo uns Domingos (como foi o caso de hoje) e onde já vou conhecendo meia dúzia de coisas e de pessoas.
Leiria, aos Domingos, esvazia, com exceção das esplanadas da Praça Rodrigues Lobo e do Fórum, junto à ESTG. De resto, a urbe fica votada a meia dúzia de skaters junto à fonte luminosa, a uma mão-cheia de estudantes que tentam (dissimuladamente? ainda não percebi) fumar algo mais do que cigarros nos recessos da rua direita, ao par de bêbados da praxe de toda a cidade portuguesa (ainda agora, na minha volta pós-jantar, acabei de me cruzar com um, indignadíssimo por o Café Colonial estar fechado), aos apreciadores dos bifes da Camões e aos fregueses que entram e saem das igrejas e capelas.
Eu, hoje, estava resolvido a passar mais um Domingo típico de Luís-em-Leiria-cheio-de-coisas-para-estudar, e já tinha tudo programado a régua e esquadro (como tenho a mania de fazer, mesmo sabendo, de antemão, que a maior parte destas minhas planificações nunca se concretiza completamente). Ou seja, pondo em prática o conselho de “Domingo não angustiado é Domingo programado”. E as coisas foram correndo bastante conforme o previsto: acordei cedinho (tinha-me deitado a horas decentes na véspera: tese oblige) e lancei-me ao trabalho. Por volta das 11.15, pus-me a caminho da missa da Sé. Terminada esta, fui rumo ao único quiosque que conheço que está aberto aos Domingos na parte histórica da cidade (se calhar há mais outros 15, mas, enfim, eu só conheço ESTE), sito no (bastante sinistro, e ainda mais sinistro aos Domingos, quando nem a pizzaria nem o café lhe dão alguma animação) D. Dinis e, munido do “Público” (fiquei a saber, entre outras coisas, que a pobre Helena Cidade Moura tinha morrido, que o Santos Neves é descrito, pelo que percebi, como um lunático com laivos de génio mas pouca disciplina mental – ou seja, fujam dele! – e que o Albano Homem de Mello, criador dos excelentíssimos H3, já nem se importa muito com o bárbaro nome com que o batizaram), fui tomar um café ao “Martin & Thomas” (caso não conheçam, aconselho-vos vivamente esta pastelaria leiriense!). Bebido o café e tendo dado uma primeira vista de olhos ao jornal, pus-me, com a barriga já a roncar pelo almoço, a caminho de casa. Os roncos e o apetite crescente que os acompanhavam levaram-me a escolher o caminho mais curto, isto é, cruzar a Praça Goa, Damão e Diu (belo nome!! J), seguir por frente da igreja do Espírito Santo e pela fonte das Carrancas e, depois, cortar à direita, na António Santos Costa. A Santos Costa é uma rua estreita e relativamente íngreme (sobretudo quando venho carregado com livros, altura em que ainda me parece mais escarpada), outrora perfumada por um montão de glicínias que tinham controlado as ruínas de um velho casarão que lá havia. O casarão – ou o pouco que dele sobrava… – foi demolido (para meu pesar, que gosto muito de glicínias, e me deliciava com as baforadas bem-cheirosas que, graças a ela, dominavam a escalada da Santos Costa; mas, certamente, para bem da salubridade pública) e o terreno onde estivera implantado adaptado a parque de estacionamento, e a Santos Costa perdeu bastante do seu interesse. Desemboca esta artéria numa praça (praceta, para ser mais justo) dedicada à Rainha Santa, onde está uma escola primária toda sixties, que hoje tem graça pelo toque vintage que dá à zona. Para além da rua que eu vinha escalando, outras quatro vão ter à praça: João XXI (a mais próxima da escola), Henrique Sommer (artéria burguesa, a condizer com o nome, com antigas vivendas, na sua maioria curiosas e a precisar de restauro), Barreto Perdigão (de nome aristocrático, mas mais viela do que rua, e descendo até ao antigo liceu) e uma outra, da qual não me lembro do nome.
Pois bem, era Domingo, e soavam as 13.15 nos relógios de Leiria, que ecoavam nas ruas vazias e apenas batidas pelo sol. Não contando com um gato, não havia vivalma nas redondezas (ou seja, nem nas 5 ruas, até onde a minha vista alcançava, nem na praça) para além de mim. E eis que, ao chegar ao término da Santos Costa, vejo um rapaz, de barba, vestindo apenas as calças, com a camisa e a t-shirt debaixo do braço, as sapatilhas nos pés calçadas à pressa (com os atacadores por apertar volteando), a correr desalmadamente João XXI abaixo, atravessando num ápice a Praça Rainha Santa, e sempre olhando para trás, como se estivesse CHEIO de medo de estar a ser seguido. Sempre correndo, o mais que podia, corta para a Henrique Sommer, onde entra, a toda a brida, num prédio (eu sei qual foi o prédio, mas a solidariedade e a educação impedem-me de denunciar alguém cuja culpa não foi provada), cuja porta de entrada fecha com estrondo.
Foi, caros leitores, um momento… extraordinário! Inusitado na pacatez planeada do meu Domingo de estudo, inusitado na provinciana Leiria dos fins-de-semanas!
É óbvio que eu estava à espera de ver, segundos depois, o perseguidor no encalço do rapaz em tronco nú, mas… nada!

O que se terá passado? Bom, esta cena de filme talvez tenha uma explicação também de filme: o desalinho em que o rapaz estava, o facto de não ter tido tempo sequer para se vestir (pelo menos conseguiu pegar na camisa e calçar as sapatilhas), o ar apavorado olhando para ver se o seguiam… hummmm, desconfio bem que alguém andara experimentando cama alheia… Mas não sei, não há certezas. E ainda bem que não houve explicações, porque o insólito daquela cena de filme para as massas, mas vivida com um realismo impressionante (naturalmente, pois era real!) obrigou-me a conter uma gargalhada – pelo divertido do acontecimento picaresco, pelo inesperado daquela estranha visão – que, apesar de não estar prevista nos meus cuidadosos planos para o Domingo de hoje, me fez sentir mais vivo e bem disposto, e me deu tema para concluir a jornada deste dia 22 com mais um contributo para estes verdejantes Prazos do Serrazim! J

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