Tuesday, February 18, 2014

Fastball ao descer a marquês de Pombal

Tive hoje uma reunião que correu especialmente bem. Nada de importante: apenas um dos vários encontros de preparação do semestre a que todos os professores estão acostumados. No meu caso, contudo, tratou-se do primeiro contacto com uma licenciatura e um departamento que não conhecia. E estava tudo em aberto… “Como serão eles?” – é o que inevitavelmente se pensa numa ocasião destas (sobretudo se estamos a falar em pessoas de uma área científica bastante diferente da nossa). “Serão terrivelmente bizarros? Ou pessoas normalíssimas? Ou até simpáticos?”. Tive sorte e calhou-me a última hipótese. Era realmente um grupo cordial e interessante, trataram-me muito bem (portanto, são gente de bom gosto!) e aprendi uma série de coisas.
Em paralelo, recebi notícias de um lugar do qual gosto bastante: o Max Planck de Frankfurt, aka o paraíso dos historiadores do direito. O lugar onde os juristas que se dedicam à história se reúnem tem sempre contornos algo idílicos para os poucos que somos. É o Valhalla pelo qual suspiramos quando nos sentimos isolados. Não se tratou de nada de especial: na verdade, apenas de informações banais sobre a eventualidade de um colóquio que ainda nem sequer se sabe bem se, como e quando se vai realizar. Mas a baforada germânica (e não merkeliana, sublinha-se!) apareceu em boa altura.
Finalmente, chegaram-me novas de um grupo de investigação franco-espanhol que integro.
Ou seja, três pedradas no charco da normalidade tornaram mais interessante este dia em que o sol se decidiu finalmente a brilhar um pouco e permitiu que as sapatilhas (e não só!) não ficassem totalmente empastadas de pó do court.
Ora, é sabido que o nosso cérebro tem mecanismos que não compreendemos e felizmente nos escapam. Por isso não consigo explicar de forma 100% racional a razão pela qual, na viagem de regresso da ESTG para casa, ajoujado pelo peso de cartapácios de direito e bioética, começou a retinir violenta e repetidamente na minha cabeça o velho the way dos Fastball. Uma música desgastada (creio que é de 98), da qual já não me lembrava há que séculos. Para os que não sabem ou não se lembram, a base do the way – que tocava repetidamente nos finais dos anos 90 – é a história de um velho casal americano que a certa altura decide contrariar o previsível e embarcar numa aventura a dois. Recorramos à básica e sempre vilipendiada wikipedia (tanto que já não me lembrava de todos os pormenores da história, mas apenas dos seus contornos gerais):
“Fastball bassist Tony Scalzo came up with the idea for the song after reading journalistic articles which described the disappearance of an older married couple, Lela and Raymond Howard from Salado, Texas, who left home in June 1997 to attend the Pioneer Day festival at nearby Temple, Texas, despite Lela's Alzheimers and Raymond recently coming from brain surgery. They were discovered two weeks later, dead, at the bottom of a ravine near Hot Springs, Arkansas, hundreds of miles off their intended route.
About the song, Scalzo said that "It's a romanticized take on what happened" - he "pictured them taking off to have fun, like they did when they first met." The song's lyrics revolve around an older married couple who decide to give it all away by packing up and going driving. Along the way, their car breaks down, so they continue on foot.


Gostei deste casal desde a primeira vez que o “conheci”. Tal pode parecer paradoxal para alguém que como eu é tão dado a rotinas e a manter algumas coisas inalteradas. Mas na verdade é fácil de compreender.

Ficar ad eternvm preso na mesma realidade modorrenta ou tentar novos voos – ainda que arriscados, mas tendo sempre uma base para onde regressar caso necessário (o casal do the way dos Fastball manteve a sua casa, certo?) – para mais com a pessoa de que se gosta… Há hesitação possível? Eu fazia o mesmo: saía antes de o sol nascer (o que é evidente para os fãs da aurora) e punha-me a andar. Caso o carro pifasse – convenhamos que não é uma hipótese a colocar liminarmente de lado atendendo ao meu jeito para conduzir – queria lá saber. Também continuava a pé. Não cedia, não desistia, não voltava atrás de mãos a abanar e oprimido por uma sensação de derrota. Não me conformava. Não vergava ao imobilismo. E se nos deparássemos com uma qualquer situação terrível? E se daí decorresse mesmo a morte? Ora, paciência. É óbvio que não pouparia meios para o evitar. Mas caso as minhas tentativas para escapar se revelassem infrutíferas e fosse inevitável um desenlace fatal sabia que embora tivesse ficado a meio pelo menos fizera tudo a fim de dobrar o cabo. E esperava – lá está – tornar à base. Enfim, eu não… os meus ossos ou o que de mim restasse. O casal do the way foi descoberto duas semanas depois, no fundo de uma ravina. Já não sobraria grande coisa. Se o mesmo acontecesse comigo, os meus parentes mais próximos saberiam bem o que fazer. Teriam a maçada de reunir os meus vestígios e encaixá-los num canto do jazigo de Poiares. Ah! E mandar celebrar no mínimo uma dezena de trintários gregorianos por padres jesuítas! Na certeza porém de que eu morrera feliz a tentar dar mais uma passada.
É por isso que gosto mesmo do que (pelo menos para mim) é a lição (ou a moral, se me apetecer imitar a duquesa no Alice no País das Maravilhas) desta parelha texana de Salado - a ponto de me fazer recordar músicas obsoletas e ultrapassadas há centúrias! 






1 Comments:

At 3:36 AM, Anonymous Ni said...

adoro esta música :D

"And it's always summer, they'll never get cold
They'll never get hungry
They'll never get old and gray
You can see their shadows wandering off somewhere
They wont make it home
But they really don't care
They wanted the highway
They're happy there today, today"

 

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